O que é a mielomeningocele (ou espinha bífida)?
Mielomeningocele é uma doença neurológica que decorre de um defeito na formação da coluna do feto, ainda na sua fase embriológica. Isso quer dizer na prática que a coluna do feto não se forma adequadamente, não se fecha e não é recoberta pela pele. Ou seja, o feto fica com sua coluna malformada e “aberta”, com tecidos nervosos expostos na pele. Por este motivo a mielomeningocele é um tipo de disrafismo espinhal aberto (veja figura abaixo)
Para saber mais sobre a mielomeningocele acesse aqui.
Todas as mielomeningoceles são iguais?
Absolutamente não! Elas variam de acordo com seu tamanho e a altura da coluna que se encontram, podendo ser cervicais, torácicas, lombares e lombo-sacras. A extensão (tamanho) e localização (altura) do defeito determina melhor ou pior prognóstico neurológico para a criança.
Quando se descobre que o feto tem mielomeningocele?
Geralmente no USG morfológico do segundo trimestre, que deve ser feito entre a 21ª e a 24ª semana de gestação, mas é possível visualizar a mielomeningocele a partir da 17ª semana de gestação. Dependendo da posição que o bebê está, do aparelho e de outros fatores, entretanto, o médico que está realizando o ultrassom pode não conseguir visualizar a coluna do bebê adequadamente e esta descoberta acontecer em exames de USG posteriores (mais tardios).
Vale lembrar que no ultrassom pode ser estimado o tamanho e a localização da mielomeningocele. Porém, em alguns casos, sobretudo quando a equipe decide por realizar a cirurgia fetal de mielomeningocele, pode ser solicitada também uma ressonância magnética fetal. A ressonância ajuda o estudo da malformação, bem como de outros fatores associados, como Chiari, hidrocefalia e outras malformações associadas.
Descobri que meu bebê tem mielomeningocele, o que fazer?
A primeira coisa é se informar sobre a doença e seu prognóstico e possíveis problemas de saúde que o bebê poderá vir a apresentar. Você pode acessar aqui mesmo no meu site um pouco mais de informações sobre a mielomeningocele clicando aqui. Sempre que possível deve-se agendar uma consulta com um neurocirurgião pediátrico neste momento que é feito o diagnóstico (o mais breve possível), para que ele possa te explicar ainda melhor sobre o caso específico do seu bebê o que deve-se esperar da doença, planejando-se da melhor maneira para o tratamento.
Se a mielomeningocele for diagnosticada antes de 26 semanas de gestação, o neurocirurgião pediátrico, em conjunto com a equipe de medicina fetal, avalia a possibilidade de fazer a cirurgia intraútero. A partir de 27 semanas, habitualmente não se realiza mais a cirurgia intraútero, sendo recomendada a correção da malformação logo após o nascimento.
Descobri a mielomeningocele do meu bebê com menos de 26 semanas de gestação – o que fazer?
Conforme expliquei o primeiro passo é procurar um neurocirurgião pediátrico e/ou um centro de medicina fetal que tenha experiência com cirurgia intra-útero. Por ser uma cirurgia complexa, geralmente as equipes de neurocirurgia e cirurgia fetal que a realizam são treinadas em conjunto e trabalham em grande sintonia para o sucesso do procedimento. O hospital, centro cirúrgico, equipe de enfermagem e anestesia devem também ter um preparo e treinamento para atuar neste procedimento. Nossa equipe está vinculada a equipe de medicina fetal do Hospital Sepaco, com quem temos uma excelente parceria e amizade. Juntas trabalhamos dia a dia para um bem sucedido tratamento dos nossos pequenos pacientes.
Após a consulta com a equipe multidisciplinar, discutimos caso a caso se a correção intraútero é possível, se for, ela é proposta para família. Podem ser necessários exames adicionais como ressonância do feto para avaliação neurológica, a critério dos médicos da equipe.
É importante que a criança realize a cirurgia no hospital onde também ocorrerá provavelmente o parto do bebê. As equipes assim já estão totalmente cientes do caso, do que ocorreu na cirurgia e do que esperar após o nascimento. Este entendimento e planejamento é muito importante para a condução adequada do caso do bebê. Também é fundamental que este hospital tenha o suporte e a experiência de UTI neonatal, equipes multidisciplinares pediátricas para auxiliar as comorbidades do bebê após o nascimento e a equipe de neurocirurgia pediátrica presente, como já dito, preferencialmente a mesma que realizou a cirurgia do feto.
Caso a cirurgia pré-natal não seja possível é programado o parto em conjunto com a equipe de neurocirurgia para o suporte e correção pós-natal da malformação do bebê.
Por que sempre tentamos oferecer a correção intra-útero a céu aberto da mielomeningocele?
Em 2011, foi publicado um estudo prospectivo e randomizado (que equivale a melhor qualidade de evidência em estudos científicos) comparando a correção pré-natal da mielomeningocele com a correção após o nascimento. Neste estudo foi demonstrado que os fetos submetidos à correção antenatal tinham 50% menos necessidade de derivação ventrículo-peritoneal para tratar a hidrocefalia, redução da ocorrência da malformação de Chiari, além do dobro da possibilidade de andar sem qualquer auxílio. Este estudo, denominado Management of Myelomeningocele Study (MOMS) utilizou a via a céu aberto para correção fetal.
As vantagens do grupo de cirurgia intrauterina foram tão superiores nos quesitos reversibilidade da síndrome de Arnold Chiari II, diminuição da necessidade de derivação do líquor cerebral (válvulas) e funções mental e motora, inclusive com aumento da chance de caminhar por si só, que o estudo foi interrompido por ser eticamente inviável se indicar a cirurgia pós-natal quando há a possibilidade de se fazer a correção intraútero.
Após este estudo muitos outros se sucederam, sendo assim atualmente é recomendado, dadas tais evidências científicas, que a correção intraútero seja oferecida e realizada sempre que possível do ponto de vista técnico.
Existem outras técnicas para correção da mielomeningocele além da técnica clássica a “céu aberto”?
Sim. Vale ressaltar que a técnica que teve o benefício comprovado pelo estudo MOMS foi a técnica clássica. Outras técnicas, como a fetoscópica, ainda não tiveram benefício amplamente comprovado através de fortes evidências como o do estudo MOMS.
Qual a diferença da técnica “a céu aberto” para a fetoscópica?
A técnica recebe este nome de “céu aberto” porque o útero da mãe é totalmente exposto, embora aberto apenas em uma pequena porção para permitir a cirurgia do feto. Na cirurgia laparoscópica ou fetoscópica, uma câmera e alguns instrumentos são inseridos no útero fechado, e a cirurgia que ocorre no feto é feita com auxílio deste vídeo.
Todas as técnicas têm vantagens e desvantagens. A técnica a céu aberto evoluiu muito, ficando cada vez menor e menos invasiva, hoje sendo possível utilizar um microscópio cirúrgico em uma pequena abertura no útero (de cerca de 3cm) para operar o feto. Quanto menor a abertura no útero menor é o risco de uma série de complicações. Além disso, por ser aberta e o neurocirurgião visualizar diretamente o defeito, podemos realizar uma correção em planos e etapas cirúrgicas bem semelhantes ao que fazemos após o nascimento do bebê, que é uma técnica sabidamente consagrada há anos na neurocirurgia.
No entanto, existem riscos maternos associados à utilização dessa via, como cicatrização uterina desfavorável no local da cirurgia em, aproximadamente 35% dos casos. Além disso, a abertura na pele é ampla, pois o útero precisa ser exposto para fora da cavidade abdominal. Esta zona de fragilidade causada pela cirurgia contraindica o trabalho de parto, sendo obrigatório uma cesárea para o parto do bebê, inclusive em futuras gestações.
Já a cirurgia laparoscópica/fetoscópica o risco materno é menor, pois ela tem a vantagem de ser menos invasiva, inclusive permitindo o parto normal. Porém tecnicamente é mais difícil e desafiador posicionar o feto e praticamente impossível realizar as correções anatômicas do mesmo modo que é feito na técnica clássica. A longo prazo ainda não se sabe se estas crianças podem ter complicações relacionadas a forma diferente como é operada a malformação. Ainda não há um estudo da qualidade do MOMS para avaliar esta técnica e nem comparar uma técnica com a outra em termos de resultados.
As duas técnicas tem aumento de taxa de parto prematuro, sendo ainda maior na técnica laparoscópica.
Qual técnica (céu aberto x fetoscópica) eu devo escolher?
A escolha desta técnica varia de acordo com o treinamento e a preferência da equipe. Os pais sempre que possível devem se informar e conversar com os médicos da equipe sobre as opções, assim podem se sentir seguros com sua escolha.
Veja abaixo algumas imagens da cirurgia fetal da mielomeningocele clássica – a céu aberto.
O plano de saúde (convênio médico) dá cobertura para esta cirurgia?
Infelizmente até o momento que este artigo foi escrito ainda não constava no Rol da ANS a cobertura contratual obrigatória para correção de mielomeningocele pré-natal (intraútero). Entretanto, devido ao benefício demonstrado por esta cirurgia, inclusive diminuindo sequelas neurológicas e mais cirurgias futuras, muitos convênios tem cada vez mais optado por dar cobertura ao procedimento e muitas famílias tem lutado para conseguir que seus filhos tenham a oportunidade de realizar este procedimento.
Como agendar uma consulta para avaliação?
As consultas podem ser agendadas diretamente por um dos nossos meios de contato que você pode acessar clicando aqui. Por ser uma situação particular em que a cirurgia deve acontecer antes de completar 27 semanas de gestação, solicitamos que na ocasião do agendamento da consulta médica solicite a nossa secretária um encaixe prioritário. Na consulta todos os exames pré-natais devem ser levados para avaliação.